terça-feira, maio 30, 2006

 

Quem queres impressionar hoje?

Professor Joaquim Braizinha numa apresentação de Doutoramento:

"...mas você está enganado, a arquitectura não é feita para as pessoas, ela é feita para os arquitectos".

segunda-feira, maio 29, 2006

 

PNPOT

Está aberta a discussão pública do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT), disponível neste Site, e existe ainda um blog de discussão do assunto patrocinado pelo Ad Urbem.

sexta-feira, maio 26, 2006

 

São as coberturas horizontais, estúpido!


De todos os caprichos arquitectónicos que resistiram do modernismo, este é aquele que me mais intriga, a mania das coberturas horizontais. A primeira conversa habitual entre um cliente e um arquitecto há sempre de parar na questão dos telhados. "...mas oiça arquitecto, não me meta daqueles terraços horizontais que aquilo é horrível e deixa entrar água! Porque não um telhadinho com um friso bonito e tal? ...", e é então que o arquitecto explica que a cobertura horizontal faz parte de um estilo "moderno" de vida, de vivência espacial, em que os planos se individualizam e se extendem desde o interior até ao exterior, criam continuidades espaciais, que é aquilo que se faz hoje em dia, etc. O cliente insiste, "ah, mas o telhado é tão bonito..." e assim o arquitecto cabisbaixo acede, com a condição de o telhado ter apenas uma água, para assim se manter, mas não já com a pureza da ortogonalidade, a tal individualidade dos planos que se extendem...

Mas aquilo que me fascina mais nesta conversa é que ela é praticamente universal, sendo que os arquitectos que concebem casas com telhados tradicionais são segregados (epa, o estágio nem foi grande coisa, só fazer casas com telhados, vejam só...), e apenas como excepções excêntricas são tidas em conta nas revistas de arquitectura. Isto faz-me pensar que existe de facto um tabu em relação aos telhados, e uso os telhados como o símbolo mais visível de todos os outros caprichos modernos, derivado da imagem mítica modernista, mas que carece de uma explicação razoável do porquê, além de ser "moderno". É que o argumento, não sei se repararam, é oco. Até hoje, é bem sabido que o telhadinho vermelho é o melhor sistema construtivo de coberturas engendrado.

Este tipo de linguagem, surgida na mais pura abstracção do que é o "espaço", não entendido como um lugar, com centros, com símbolos, com histórias, mas sim descartiano, X,Y,Z, ou seja, sem relação com o mundo real, inseriu-se na cultura académica dos arquitectos como uma injecção, pese embora os esforços do pós-modernismo em acabar com esse dogma.

Neste aspecto, aprecio os grandes arquitectos, pois esses nunca negam seja o que for, e se for necessário usar telhados, pois seja, e farão das obrigatoriedades elementos maravilhosos de arte, vejam só as casas do Siza (para mim das melhores) que se fizeram na sua meia carreira, vejam as construções do Távora, vejam o caso do Steven Holl, Aldo Rossi, etc. No entanto, para a actual inteligentsia arquitectónica, o uso do telhado é sobretudo uma ironia, no caso dos Mateus, ou dos MVRDV, por exemplo, e para mim a ironia é apenas sinal de que o desejo do novo combinado com o desejo do melhor não consegue encontrar resposta mais verdadeira que o óbvio e tradicional, e então escarne-se, ironiza-se, nega-se afirmando.

(ah, estiveste tão próximo, Siza Vieira, porque te foste embora? E os teus filhos são uma sombra...)

Para quando a libertação dos fantasmas da arquitectura? Para quando o início do uso das coisas singelas mas sólidas, brutas mas verdadeiras, tão ridículas como o amor? Um dia hei de desenhar uma casa assim.

terça-feira, maio 23, 2006

 

pequeno àparte

... mas não podia deixar de apreciar a sobremesa que deixei no meu post anterior, uma imagem que simplesmente apetece comer, de tão sexy e impossível que é, vidros sem caixilhos nem pilares sob coberturas de terras vegetais e lareiras penduradas nesses tectos flutuantes... um branco tide sobre a relva mais perfeita que existe...

Que pena que tenha de se destruir esta ilusão tão perfeita, mas enfim os clientes não pagam apenas pelos desenhos, querem também coisas feitas neste mundo onde a gravidade é uma realidade.

Mas eu, sinceramente, fico-me pelos renders. Com sal, por favor.

 

Arquitectura como objecto de marketing? Achas mesmo?


Com falta de tempo, mando-vos um link especial que muitos já devem conhecer, mas eu ando sempre atrasado em relação ao mundo...

Aldeia especial com sabor a arquitectura super-star, cheia de plantas, renders e curtas memórias descritivas num único site. A ver as plantas super-corredores do Carrilho da Graça, as lajes de 30cm com relva do Siza filho, e alguns aquários. De resto, são propostas interessantes, com um cheirinho por vezes a enchidos de chouriços, por outras vezes a boa inteligência, trabalho e evidente talento arquitectónico. Neste particular os meus olhos recaem nas casas de Gonçalo Byrne, sempre pronto a experimentar as fronteiras da arquitectura, nos estudos do JP Falcão de Campos, na casa redonda do duo Egas José Vieira e Manuel Graça Dias - este que recentemente numa entrevista disse nunca fazer moradias pois isso era contra o seu princípio de urbanidade... exceptuando quando se trata de uma oportunidade de marketing como esta porventura, mas estou a ser mauzinho: a casa é boa.

Vejam por vocêzes. A qualidade arquitectónica já não é apenas um bem humanitário e humanista, é sobretudo rentável enquanto característica de um produto essencialmente de marketing estético-espampanante. Aldeia de Elites? Duvido. Antes um exercício de pura vaidade, tanto da parte de quem projecta, como de quem promove, como de quem compra. Futuro da urbanística? Deixem-me rir. Nem um pingo de questões hídricas abordadas (à óbvia excepção da monumental rega do campo de golfe que terá de existir), aproveitamento de energias (nem uma placa solar...), questões ambientais, etc.

Mas é um "grande" projecto, fazendo parte da super-star elite pt, e já conta com o patrocínio do estado ao dar-lhe importância PIN (Potencial Importância Nacional) do projecto.

Ahh, viva a arquitectura fash!

domingo, maio 14, 2006

 

Modernismo e Tradição



Deparei-me com um debate com mais de uma década entre os excelentíssimos Peter Eisenmann e Leon Krier. Personagens antagónicos, paradoxais, que defendem ideias completamente díspares. Enquanto que o primeiro defende uma tradição de inovação, de rasgar a superfície do mundo e encontrar novas formas para a “presentidade”, o hoje, o segundo defende que essas formas já estão encontradas e que é no seio da tradição que se vai buscar as soluções aos nossos problemas, invocando ainda a preferência da população que recai sobre os edifícios tradicionais, cidade tradicional, ao invés da modernista, fria, calculista e vazia.

Como discordar do que cada um diz? E no entanto, o que eles dizem é paradoxalmente verdadeiro e diferente, contraditório mesmo. Quando me lembro das minhas conversas com pessoas não-arquitectas, dizem-me sempre que Marco de Canavezes é quase um quartel de bombeiros e que casas à caixa de fósforos não são casas, e depois dizem-me que gostam de telhadinhos, rocócós, decorações e etc. Mas eu não penso da mesma maneira, e não, não é só uma questão de gosto. E depois considero: até que ponto não fui eu próprio “formatado” pelo discurso que me deram na faculdade, até que ponto não entrei eu numa cultura diferente das “pessoas normais”, dando primazia a critérios completamente diferentes dos que tinha antes de iniciar o meu curso? (E, já agora, que critérios seriam esses? Qual a sua validade? Qual a validade do gosto de uma pessoa que nunca se debruçou sobre a arquitectura?).

Eu concordo com ambas as visões. Parece demasiado demagógico e simplista, mas não é como o caso daquele em que um diz 2+2=4 e outro 2+2=6, virando eu com a minha genialidade moderadora dizendo que não pessoal, vamos dialogar, digamos 2+2=5 e ficamos todos felizes. É antes como o padre João Seabra costuma dizer, assumir o paradoxo até ao fim, assumindo todas as características aparentemente contraditórias de um único facto como verdadeiras e admirando o constante paradoxo da vida.

Tive um professor que dizia que “A arte é para estúpidos”. E é, a arte fala-nos das coisas tão essenciais e tão universais que a todos diz respeito. Mas outro nosso amigo sempre que se lhe ouvia esta frase entrava em parafuso, e não sem razão. A sensibilidade educada é necessária para compreender e admirar certas obras mais difíceis.

A questão resolve-se no assumir uma cultura. Um problema. Uma ideia. Não formal, estilística ou metafórica, mas uma ideia de Vida. A arquitectura é expressão de vida humana na acção concreta do quotidiano, e deve o arquitecto ler e compreender o corpo e espírito deste quotidiano cuja arquitectura vai possibilitar. Corpo, ou seja, carne, matéria, problemas directos e pragmáticos, sons, programas, ventos, sol, térmica, ergonomia humana ou animal. Mas também espírito, ou seja, alma, personalidade, desejo, afirmação do “significado do programa”, ou seja, quando uma casa faz o seu habitante querer viver nela, quando uma escola induz o aluno a estudar, quando uma igreja nos dá vontade de nos sentarmos um pouco e escutarmos o silêncio (“essa ausência mais forte do que a presença”), quando um recinto desportivo dá vontade de pegar numas chuteiras e dar à bola. A isto se chama Morada e é este o primeiro objectivo de qualquer arquitecto.

Estou a falar idealmente, mas devemos pensar também que todos nós fazemos isto, conscientemente ou não. Mas então o que é uma boa arquitectura, será a dos rocócós, ou a das linhas e planos? Será que a vida é simplesmente uma colectânea de paradigmas escolhidos arbitrariamente, e que estamos num simplesmente por acaso, poderíamos bem estar noutro completamente diferente e chamar-lhe verdadeiro na mesma? Eu não acredito em tal coisa. É demasiado esquerdista para mim. E mentiroso também, pois a realidade não o afirma. Quando olho para o mundo, vejo em todos os homens um desejo de liberdade e de amor que é comum a todos, independentemente de todos os outros factores e censuras que cada um tem na sua sina, e não me venham dizer que amam coisas diferentes, eu não acredito. O que me interessa é precisamente ver o que a arquitectura realmente diz, faz fazer, incita, o que acolhe e o que afasta, a essência que é totalmente dependente da forma, mas lhe é outra coisa. Pode ser uma “villa romana”, conceito que usamos para designar um “tipo” de casa, ou alma, como eu prefiro. Enquanto que teatro é programa, anfiteatro grego é arquétipo com personalidade definida e clara.

Arquétipos. E quando se escolhem os arquétipos perfeitos para a situação dada, pois podem ser mais que um ao mesmo tempo, e quando se reinterpretam segundo as condicionantes do lugar, do programa, da nova sociedade e da cultura, nunca poderá surgir uma arquitectura do passado, ela nunca será “antiga”, nesse sentido, mas sim “presente”, moderna, ou então eterna.


Para finalizar, como exemplo máximo de modernidade e tradição juntas com a harmonia simples de quem quer simplesmente Construir (que em alemão deriva da mesma palavra que Habitar, como Heidegger ensinou), mostro-vos algumas imagens de um dos edifícios modernos mais belos, na suíça, em Vals. Eu sei, é batido demais, seria sempre mais interessante buscar coisas menos vistas, mas não resisto sempre que desenho algo tento sempre recordar a sua metodologia, a sua forma de ver. São umas termas de luxo, construídas dentro de um complexo hoteleiro e no sopé de uma montanha branca no topo, perto do vale. Parece fria e “caixuda” ao primeiro lance visual. Mas não. Reparem bem, o edifício não é nada mais do que umas Termas Romanas, com a mesma espacialidade, som, eco, atmosfera, materialidade. É uma interpretação fenomenal da Tradição, sem fugir à modernidade. Onde estão as cornijas? Onde estão os arcos de volta perfeita (circulares)? Onde estão as cerâmicas? Não estão. Porque estas Termas Romanas são Suíças, do século XX e falam também de outras coisas, como a Espeleologia, a Geologia: é um afloramento rochoso que sai da montanha e que acolhe uma gruta pela qual entramos, na escuridão total, na dimensão de um corredor claustrofóbico. Há tempo para a escala subir, frestas de luz entram, o som aumenta de reverberação, a estrutura torna-se mais racional. Saímos das cavernas para entrar numa Arquitectura. E dá vontade de tomar banho.

Fica a promessa de procurar mais exemplos. E desenvolvê-los mais.

sábado, maio 13, 2006

 

Alkoolhismo


Falou-se imenso sobre a tragédia urbanística que abalou a cidade do Porto aquando da criação da Casa. Milhares de vozes acorreram a dizer que o Porto não é a cidade genérica e que Koolhas abusou completamente da malha urbana, que "destruiu" escalas e etc e tal. O pior desses momentos foi quando, na minha escola, apareceu um nome de renome, a admirada Françoise Choay. Veio falar do anti-urbanismo, de como as escolas modernistas destruíram a cidade tradicional e do quão mau era todo o modernismo e todo o paleio já habitual, e usou a Casa como exemplo máximo.

Ora eu, que não me tenho por parvo (embora ainda não tenha comprado nada no media markt), comecei a pensar um pouco. Já viram a Casa? Parece um meteorito caído do céu. Poderá colocar-se em causa esta "queda", porventura arbitrária, em si, conceito facilmente apelidado de "anti-urbanístico" pelo menos numa cidade como o Porto, mas o facto é que o resultado final não é assim tão mau como o pintam. Cria uma referência na rotunda e na própria cidade, seguindo o juízo de Kevin Lynch. Cria um plateau (desculpem o francesismo) bastante urbano no seu acesso. Tem uma escala e altura apropriadas para a malha urbana existente (tendo em conta de que ainda há urbanismo a fazer na zona).

Quer dizer, quando uma pessoa vê coisas todos os dias à sua volta essas sim aberrantes do ponto de vista urbanístico, como o novo Tribunal de Sintra, ou a multitude de Centros Comerciais que tencionam substituir os antigos centros populacionais (tema que dava para outro post), ou a zona do estádio do Benfica (que desastre urbanístico), ou ainda a Alta de Lisboa, isto sem sair do Distrito... virem-me dizer que o Koolhas é o demónio da urbanidade é não ter senso nenhum na cabecinha.

Parece-me é que existe um ódio oriundo da inveja e desconfiança das elites "superstars" da arquitectura, usando todos os meios e argumentos para deitar abaixo as suas obras, por mais despropositadas que sejam. Parece-me uma mania esquerdista muito em voga hoje em dia, uma mania algo egocêntrica oriunda de uma frustração de não conseguir lá chegar também, uma mania de criticar tudo e todos, porque simplesmente "não percebem", e quanto maior o alvo, menos rigorosas precisam de ser as críticas, tudo serve.

domingo, maio 07, 2006

 

Pico 2


O ser humano é de uma estupidez infinita, já o dizia Einstein, mas temos de admitir que há coisas que ultrapassam a maior inteligência do mundo, e quando se fala do nosso planeta enquanto um todo geopolítico, energético e económico, não haverá assunto mais imprevisível e incontrolável seja da parte de quem for, nem mesmo de Pentágonos ou de Bin Ladens.

Há coisas que são, simplesmente, inevitáveis. Por mais que existam burros que não a reconheçam. E que nos ultrapassam enquanto indivíduos, nações ou bandos terroristas. Dito simplesmente, a civilização mundial tal como a conhecemos, ou seja, uma civilização baseada no contínuo crescimento económico, social e energético não vai ter de acabar, vai mesmo acabar. E podem vir-me com aquela conversa, como dizem os outros "os meus filhos que se preocupem com essas coisas", ainda falta tempo e há praí tanta alternativa, que não vai alterar nada. O facto é que o futuro é hoje.

O que se passa é bastante simples de explicar. O petróleo, base fundamental (e praticamente única) de toda a nossa vaidosa civilização, vai atingir o seu Pico de produção entre os anos 2000 e 2010. Há quem diga que já o atingimos em 2003, outros mais optimistas atrasam o prazo para daqui a quatro anos, mas o consenso é geral, o crescimento de produção do petróleo acabou. Reparem que não estou a falar do "fim" do petróleo, estou sim a falar do fim do crescimento da sua exploração. Tendo em conta uma economia global em crescimento económico constante que necessita de 2.6 milhões de barris de petróleo a mais por dia (hoje gastamos cerca de 83.5 milhões por dia, em 2020 as estimativas apontam para 120 mihões), a procura de petróleo vai ser significativamente maior do que a sua oferta. O resultado é que o preço do petróleo irá disparar para valores ultra-astronómicos, porque é um bem essencial ao funcionamento da economia.

As consequências são previsíveis mas desvastadoras. Todas as potências mundiais tentarão lutar pelos recursos que faltam, e enquanto a América irá prosseguir uma estratégia ofensiva de manter o petróleo nas suas mãos, gerando uma contínua guerra pelos seus recursos naturais, outros países menos militarmente favorecidos (como a Europa, a Rússia e o Japão) usarão meios "alternativos", como a diplomacia e a sensibilização "anti-americana" a seu favor. Haveria um livro a dizer sobre isto, mas esta é a razão fundamental por detrás da guerra do Iraque e da guerra futura contra o Irão. Se o Irão não conseguir obter a bomba nuclear antes da invasão norte-americana, não terá a mínima hipótese militar de defesa, e daqui se compreende porquê tamanha pressão internacional e porquê tamanha teimosia por parte dos líderes do Irão.

Guerras sobre outros recursos que também irão rarear serão cada vez mais frequentes, como a água, metais industriais (aumínio, por exemplo) e até... comida. Toda a nossa economia, baseada no longo transporte e mercado internacional, interdependência de sectores e regiões mundiais irá ser gravemente afectado, colapsando a indústria da alimentação e gerando uma fome mundial sem precedentes.

Há inúmeros sites que explicam bem as consequências directas e indirectas, indico-vos um que me elucidou sobre estas questões.

.... Pronto. Tudo bem. Velho do Restelo e coisa e tal. Mas e então as energias alternativas? E o nuclear? E a eólica? E a solar? E as tão faladas pilhas de hidrogénio?

Todas estas alternativas são interessantíssimas do ponto de vista laboratorial, mas não na prática. Por exemplo o Nuclear, tão em voga em Portugal na sua discussão, depende das reservas de urânio, que estão a entrar em declínio, atingindo o seu fundo na melhor das hipóteses em 2040-2050. O seu preço irá, no entanto, subir imenso muito antes desta data, devido à cada vez maior rarefacção do urânio e do seu próprio pico de produção.

A energia eólica é, por outro lado, terrivelmente ineficaz e incapaz de produzir suficiente energia para sequer dar conta do crescimento económico que a nossa economia requer, quanto mais a substituição do petróleo.

A energia solar é, além de não muito ambientalmente correcta (a produção de painéis solares é bastante tóxica) ainda menos vantajosa do que a eólica.

As pilhas de hidrogénio não são em si uma tecnologia de produção de energia, mas quando muito, de conservação. O problema reside na inexistência de hidrogénio no planeta sem ser dentro de moléculas compostas. O mais comum é a água, cheia de hidrogénio. No entanto, a energia necessária para criar hidrogénio é maior do que aquela que a mesma quantidade gera electricidade. Deste modo, seria preciso petróleo para criar hidrogénio. Tirem as devidas elações.

Outras tecnologias ainda em investigação poderão ser bastante promissoras, tal como a fusão, ou a reciclagem de petróleo, ou inúmeras outras, mas o que é facto é que desde a sua investigação à sua produção em escalas planetárias vão décadas de trabalho árduo de que não dispomos. Seriam precisos vários "milagres" tecnológicos para salvar a situação em tão pouco tempo.

Será o fim da civilização tal como a conhecemos? Receio bem que sim, a civilização industrial vai acabar, e tal como poderão adivinhar, ainda não digeri bem a situação. Com o futuro à nossa frente, o que é facto é que ele não se parecerá em nada com o "american dream" de termos sempre mais do que os nossos pais, de um crescimento como dado adquirido ou até mesmo como direito de nascença. O pior que posso imaginar é o desespero geopolítico criar uma situação inevitável de guerra nuclear, empurrando-nos para uma situação irreversível de novo inverno medieval.

O menos mau que consigo imaginar é uma implosão económica que fará de 1929 um pequeno exemplo premonitório do que se iria passar quase um século depois, o fim escatológico da economia capitalista, passaremos fome durante alguns anos, algumas guerras irão acontecer (mas cada vez menos tecnologicamente, dado o preço impossível do petróleo) mas que depois o engenho humano irá conseguir fazer face aos problemas de que ele próprio se fez depender. Seja como for, venha o inferno ou apenas velhos do restelo, acredito que a humanidade em todos nós presentes, por mais rombos que apresentará, será um sinal de esperança sempre, qualquer que seja o panorama que se nos apresente.

Este foi um post que inevitavelmente começará uma série de novos posts aqui no blog. Mais bem escritos, espero, e mais específicos. Sobre o novo mundo que nos espera. Sobre possíveis ou não holocaustos mas também sobre desígnios que nos esperam, que nos abordarão. Descubro que vivemos sempre tempos extraordinários, quer sejam escuros ou brilhantes, mas repletos de acontecimentos dos quais eu não fazia ideia, que quando pequeno pensava que toda a vida a partir do 25 de abril seria uma seca. Que toda a "história" já se tinha passado. Pois bem, enganei-me. Ainda há muito para contar.

PS: A teoria de Olduvan está a criar uma onda de criticismo, mas para quem gosta de cenários apocalípticos com uma grande dose de cientificidade, recomendo este link.

quarta-feira, maio 03, 2006

 

A religião na arquitectura

Antes de mais nada, um aviso. Não, meu caro leitor, não o vou importunar com um texto sobre os edifícios religiosos, ou sobre o modo como a luz cai daquela parede e escorrega pela madeira, ou pedra, ou então como a areia efémera do terreiro de um mosteiro se confronta com a perenidade do corpo maciço do mesmo, ou assim.

Não. O que gostaria de partilhar convosco é uma sensação crescente que tenho de que a arquitectura é algo que é possível psico-analisar. Que todos os traços arquitectónicos, quando expressos com alguma coragem e intenção, são o resultado de um "subconsciente" em acção, palavras que são ditas no silêncio das formas construídas.

Não me tomem por parvo. Sei que o parágrafo anterior parece apenas dizer uma banalidade. Mas o que proponho é que o tomem a sério até aos pormenores construtivos de qualquer casa, e comecem a pensar no que é que qualquer forma quer realmente expressar, segundo uma metodologia quase psico-analítica. Deitemo-nos no divã Freudiano e ouçamos com atenção os edifícios que nos rodeiam, mas nunca sem deixar de parte a ironia da convocação de um provado místificador e exagerado como é Freud e a sua "psico-análise" tantas vezes apontada como sendo uma ciência que apenas se auto-evidencia (cria as suas próprias provas).





Dificuldades psicológicas à parte, apresento-vos um pensamento que me surgiu hoje à tarde: os edifícios modernistas "à Siza", ou "à Adolf Loos" ou "à Corbusier", são, parecem-me, ateus. E por uma única razão: o desaparecimento do telhado, do seu sótão e do correspondente friso, do tecto que nos protegia do céu! Acompanhem-me vocês por favor, que hoje já percebi que a qualidade da minha escrita não o tenciona fazer. A ideia é que quando se opta por fazer desaparecer por completo as ordens clássicas da base, fuste e capitel na arquitectura (embasamento, corpo, cobertura), claramente se expressa o poder absoluto do Homem sobre não só a sua vida como também à natureza e até a deus, que morreu faz tempo.

A base, que nos separa do chão, da terra (da imundície, do lamaçal, da animalidade, mas também da fertilidade) e a cobertura, que nos protege da fúria dos céus (dos deuses, da perfeição, da soberba de Ícaro, do terror do infinito, mas que nos faz sonhar) foram desdenhadas em função de uma perfeição terrena, diria que de doutrina marxista, e de uma arrogância absoluta do Homem face ao que o rodeia. Não admira que tais edifícios pareçam caixas de fósforos, não só metafóricamente mas também no seu comportamento, envelhecendo demasiadamente rápido. Esqueceram-se de uma das máximas de Vitrúvio: Firmitas!

Por outro lado, notem-se também as ginásticas enormíssimas que os arquitectos fazem em termos de projecto de execução de modo a que por fora o objecto pareça o mais perfeito e simples possível, autónomo e fácil. No seu miolo é um autêntico puzzle construtivo e nem sempre concebido ou construído da melhor maneira. É no fundo uma "fachada" que exterioriza uma força de personalidade que não passa de uma ilusão, de uma personalidade que diz "eu consigo fazer isto, não preciso de mais nada, apenas de um plano branco, vês?", escondendo por detrás todos os seus elásticos pré-esforçados numa luta incomportável e solitária contra Chronos. Uma tragédia grega sem deuses. Um enorme vazio.

E reparem também como dessa melancolia nasce uma arquitectura selvagem, de modo que até blogs inteligentes vizinhos do nosso se insurgem contra a mais essencial característica da arquitectura: a sua forma!


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