domingo, maio 07, 2006

 

Pico 2


O ser humano é de uma estupidez infinita, já o dizia Einstein, mas temos de admitir que há coisas que ultrapassam a maior inteligência do mundo, e quando se fala do nosso planeta enquanto um todo geopolítico, energético e económico, não haverá assunto mais imprevisível e incontrolável seja da parte de quem for, nem mesmo de Pentágonos ou de Bin Ladens.

Há coisas que são, simplesmente, inevitáveis. Por mais que existam burros que não a reconheçam. E que nos ultrapassam enquanto indivíduos, nações ou bandos terroristas. Dito simplesmente, a civilização mundial tal como a conhecemos, ou seja, uma civilização baseada no contínuo crescimento económico, social e energético não vai ter de acabar, vai mesmo acabar. E podem vir-me com aquela conversa, como dizem os outros "os meus filhos que se preocupem com essas coisas", ainda falta tempo e há praí tanta alternativa, que não vai alterar nada. O facto é que o futuro é hoje.

O que se passa é bastante simples de explicar. O petróleo, base fundamental (e praticamente única) de toda a nossa vaidosa civilização, vai atingir o seu Pico de produção entre os anos 2000 e 2010. Há quem diga que já o atingimos em 2003, outros mais optimistas atrasam o prazo para daqui a quatro anos, mas o consenso é geral, o crescimento de produção do petróleo acabou. Reparem que não estou a falar do "fim" do petróleo, estou sim a falar do fim do crescimento da sua exploração. Tendo em conta uma economia global em crescimento económico constante que necessita de 2.6 milhões de barris de petróleo a mais por dia (hoje gastamos cerca de 83.5 milhões por dia, em 2020 as estimativas apontam para 120 mihões), a procura de petróleo vai ser significativamente maior do que a sua oferta. O resultado é que o preço do petróleo irá disparar para valores ultra-astronómicos, porque é um bem essencial ao funcionamento da economia.

As consequências são previsíveis mas desvastadoras. Todas as potências mundiais tentarão lutar pelos recursos que faltam, e enquanto a América irá prosseguir uma estratégia ofensiva de manter o petróleo nas suas mãos, gerando uma contínua guerra pelos seus recursos naturais, outros países menos militarmente favorecidos (como a Europa, a Rússia e o Japão) usarão meios "alternativos", como a diplomacia e a sensibilização "anti-americana" a seu favor. Haveria um livro a dizer sobre isto, mas esta é a razão fundamental por detrás da guerra do Iraque e da guerra futura contra o Irão. Se o Irão não conseguir obter a bomba nuclear antes da invasão norte-americana, não terá a mínima hipótese militar de defesa, e daqui se compreende porquê tamanha pressão internacional e porquê tamanha teimosia por parte dos líderes do Irão.

Guerras sobre outros recursos que também irão rarear serão cada vez mais frequentes, como a água, metais industriais (aumínio, por exemplo) e até... comida. Toda a nossa economia, baseada no longo transporte e mercado internacional, interdependência de sectores e regiões mundiais irá ser gravemente afectado, colapsando a indústria da alimentação e gerando uma fome mundial sem precedentes.

Há inúmeros sites que explicam bem as consequências directas e indirectas, indico-vos um que me elucidou sobre estas questões.

.... Pronto. Tudo bem. Velho do Restelo e coisa e tal. Mas e então as energias alternativas? E o nuclear? E a eólica? E a solar? E as tão faladas pilhas de hidrogénio?

Todas estas alternativas são interessantíssimas do ponto de vista laboratorial, mas não na prática. Por exemplo o Nuclear, tão em voga em Portugal na sua discussão, depende das reservas de urânio, que estão a entrar em declínio, atingindo o seu fundo na melhor das hipóteses em 2040-2050. O seu preço irá, no entanto, subir imenso muito antes desta data, devido à cada vez maior rarefacção do urânio e do seu próprio pico de produção.

A energia eólica é, por outro lado, terrivelmente ineficaz e incapaz de produzir suficiente energia para sequer dar conta do crescimento económico que a nossa economia requer, quanto mais a substituição do petróleo.

A energia solar é, além de não muito ambientalmente correcta (a produção de painéis solares é bastante tóxica) ainda menos vantajosa do que a eólica.

As pilhas de hidrogénio não são em si uma tecnologia de produção de energia, mas quando muito, de conservação. O problema reside na inexistência de hidrogénio no planeta sem ser dentro de moléculas compostas. O mais comum é a água, cheia de hidrogénio. No entanto, a energia necessária para criar hidrogénio é maior do que aquela que a mesma quantidade gera electricidade. Deste modo, seria preciso petróleo para criar hidrogénio. Tirem as devidas elações.

Outras tecnologias ainda em investigação poderão ser bastante promissoras, tal como a fusão, ou a reciclagem de petróleo, ou inúmeras outras, mas o que é facto é que desde a sua investigação à sua produção em escalas planetárias vão décadas de trabalho árduo de que não dispomos. Seriam precisos vários "milagres" tecnológicos para salvar a situação em tão pouco tempo.

Será o fim da civilização tal como a conhecemos? Receio bem que sim, a civilização industrial vai acabar, e tal como poderão adivinhar, ainda não digeri bem a situação. Com o futuro à nossa frente, o que é facto é que ele não se parecerá em nada com o "american dream" de termos sempre mais do que os nossos pais, de um crescimento como dado adquirido ou até mesmo como direito de nascença. O pior que posso imaginar é o desespero geopolítico criar uma situação inevitável de guerra nuclear, empurrando-nos para uma situação irreversível de novo inverno medieval.

O menos mau que consigo imaginar é uma implosão económica que fará de 1929 um pequeno exemplo premonitório do que se iria passar quase um século depois, o fim escatológico da economia capitalista, passaremos fome durante alguns anos, algumas guerras irão acontecer (mas cada vez menos tecnologicamente, dado o preço impossível do petróleo) mas que depois o engenho humano irá conseguir fazer face aos problemas de que ele próprio se fez depender. Seja como for, venha o inferno ou apenas velhos do restelo, acredito que a humanidade em todos nós presentes, por mais rombos que apresentará, será um sinal de esperança sempre, qualquer que seja o panorama que se nos apresente.

Este foi um post que inevitavelmente começará uma série de novos posts aqui no blog. Mais bem escritos, espero, e mais específicos. Sobre o novo mundo que nos espera. Sobre possíveis ou não holocaustos mas também sobre desígnios que nos esperam, que nos abordarão. Descubro que vivemos sempre tempos extraordinários, quer sejam escuros ou brilhantes, mas repletos de acontecimentos dos quais eu não fazia ideia, que quando pequeno pensava que toda a vida a partir do 25 de abril seria uma seca. Que toda a "história" já se tinha passado. Pois bem, enganei-me. Ainda há muito para contar.

PS: A teoria de Olduvan está a criar uma onda de criticismo, mas para quem gosta de cenários apocalípticos com uma grande dose de cientificidade, recomendo este link.

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