domingo, novembro 27, 2005
O Progresso
Considero-me um optimista. A minha definição de optimista é aquele que acredita que todos os obstáculos são passíveis de ultrapassar, que pensa que dado um problema de uma sociedade, havendo uma discussão nobre, atenta, responsável e criativa, a resposta conjunta obtida no final da discussão é melhor do que a soma de todas as respostas individuais que iniciaram a discussão. Acredito, ainda mais, que a melhor resposta para qualquer problema deve ser bela, porque verdadeira.
E é por isto que sou pouco tolerante a falácias argumentativas. Elas são, a meu ver, meras distracções, obstáculos artificialmente criados à frente da solução, desvios da discussão para problemas laterais e secundários. Não são, na sua maioria, desejados, nem alimentados, mas simplesmente ignorados e imperceptíveis por causa da nossa própria distracção e inexperiência retórica.
Elas advêm de um estilo de pensar, de uma cultura muito particular do pensar. Por isso é que a "diversidade" é um valor tão grande. Se um grupo não se apercebe da falácia que usa numa discussão, existe o grupo vizinho para o avisar. Por isso é que as piores de todas as falácias são aquelas que são comuns a uma generalidade de pessoas, a uma sociedade e cultura inteiras.
Uma delas, e a que hoje mais me faz perder tempo actualmente, é o argumento do "progresso". Valor que hoje define a cultura ocidental, define a evolução extraordinária dos últimos séculos, em todas as vertentes: as da imagem (moda, estilo, design, marketing), as da tecnologia (hardware, software, etc) mas também as do conteúdo, as estruturas que regemos e que nos regem (valores, regras sociais, etc).
E este é um argumento muito pernicioso, porque completamente errado, mas de um erro tão subtil que todos nós caímos nele quotidianamente. E o erro consiste em tomarmos o testemunho de um movimento evolutivo pela causa do próprio movimento evolutivo: pensarmos que o progresso existe em si como valor! O progresso não é um valor, é o processo de crescimento dos valores!
Este erro é grave porque prevê apenas uma única resposta: em frente. Não admite recuos nem paragens, não admite pausas para reflexão. Se em determinada questão a história tem vindo a seguir determinada direcção e sentido, o "progresso" indica a direcção imediata e acerebralmente: é uma "inevitabilidade histórica"! Quem ficar para trás, é "obsoleto", medindo-se tal designação não pela veracidade ou adequação dos seus valores, mas pela idade dos mesmos. Imagine-se o resultado de uma sociedade que apenas pensasse desta maneira: um frenesi de vectores todos a apontar para o seu lado e a seguir "em frente", desmembrando-se até ao infinito...
E para que não pensem que estou a delirar, apresento aqui um exemplo recente, a propósito da polémica dos homossexuais proibidos na ordenação de padres na Igreja. É uma referência incontornável do erro crasso que expliquei atrás. Cito a "ILGA":
"Julgamos que se trata de mais um erro histórico, numa longa história com bastantes erros da Igreja Católica Apostólica Romana, num momento em que, precisamente, as outras igrejas, mostram uma boa filosofia de inclusão, nomeadamente, a Igreja Anglicana e recentemente na Igreja Sueca, que, inclusivamente põe a hipótese de abençoar as uniões entre as pessoas do mesmo sexo"
Primeiro define-se a direcção: "mais um erro histórico da Igreja, numa longa história...", ou seja, é tradição e definição evolutiva da Igreja errar "historicamente", e por isso inevitável que ela fizesse mais este (não se está aqui a argumentar o erro, mas sim a sua inevitabilidade histórica e portanto a sua demonstração automática). Depois mostra-se o exemplo de quem foi "bom aluno" do progresso e o aceitou no seu leito, com uma "boa filosofia de inclusão".
Compreendo a polémica e acho que é uma boa oportunidade para discussão. Mas fora com este tipo de argumentos, pois são falsos. Apenas admitem um lado "certo" que é o lado cego do progresso. Faz-nos lembrar o comentário do Sócrates sobre Mário Soares: "Esteve sempre do lado CERTO da História" (sério? quem disse? e qual é o "errado" já agora?)
Estou totalmente de acordo com o Bernardo da Motta, do Afixe:
o aborto livre é "progresso", o sacerdócio para os gays e lésbicas é "progresso", a manipulação genética de embriões humanos é "progresso", o abandono de uma religião é "progresso". Admirável mundo novo, este que se aproxima, hã?
Deixemo-nos de tretas, e passemo-nos a tratar uns aos outros com mais respeito! Perguntemo-nos de facto sobre as matérias em questão com os valores em causa, questionemos o futuro que queremos seguir e os valores que queremos semear e cultivar.
Se for preciso parar, porque não? Se for preciso recuar, porque não? Porquê manter os erros se os reconhecermos? E quando pensarmos em todos estes valores e vivermos intensamente o presente na resolução dos problemas de um modo optimista e esperançoso, quando compreendermos que temos de nos ouvir uns aos outros e não a uma voz distante que grita progresso em tudo o que é lado...
Talvez assim... haja progresso!
E é por isto que sou pouco tolerante a falácias argumentativas. Elas são, a meu ver, meras distracções, obstáculos artificialmente criados à frente da solução, desvios da discussão para problemas laterais e secundários. Não são, na sua maioria, desejados, nem alimentados, mas simplesmente ignorados e imperceptíveis por causa da nossa própria distracção e inexperiência retórica.
Elas advêm de um estilo de pensar, de uma cultura muito particular do pensar. Por isso é que a "diversidade" é um valor tão grande. Se um grupo não se apercebe da falácia que usa numa discussão, existe o grupo vizinho para o avisar. Por isso é que as piores de todas as falácias são aquelas que são comuns a uma generalidade de pessoas, a uma sociedade e cultura inteiras.
Uma delas, e a que hoje mais me faz perder tempo actualmente, é o argumento do "progresso". Valor que hoje define a cultura ocidental, define a evolução extraordinária dos últimos séculos, em todas as vertentes: as da imagem (moda, estilo, design, marketing), as da tecnologia (hardware, software, etc) mas também as do conteúdo, as estruturas que regemos e que nos regem (valores, regras sociais, etc).
E este é um argumento muito pernicioso, porque completamente errado, mas de um erro tão subtil que todos nós caímos nele quotidianamente. E o erro consiste em tomarmos o testemunho de um movimento evolutivo pela causa do próprio movimento evolutivo: pensarmos que o progresso existe em si como valor! O progresso não é um valor, é o processo de crescimento dos valores!
Este erro é grave porque prevê apenas uma única resposta: em frente. Não admite recuos nem paragens, não admite pausas para reflexão. Se em determinada questão a história tem vindo a seguir determinada direcção e sentido, o "progresso" indica a direcção imediata e acerebralmente: é uma "inevitabilidade histórica"! Quem ficar para trás, é "obsoleto", medindo-se tal designação não pela veracidade ou adequação dos seus valores, mas pela idade dos mesmos. Imagine-se o resultado de uma sociedade que apenas pensasse desta maneira: um frenesi de vectores todos a apontar para o seu lado e a seguir "em frente", desmembrando-se até ao infinito...
E para que não pensem que estou a delirar, apresento aqui um exemplo recente, a propósito da polémica dos homossexuais proibidos na ordenação de padres na Igreja. É uma referência incontornável do erro crasso que expliquei atrás. Cito a "ILGA":
"Julgamos que se trata de mais um erro histórico, numa longa história com bastantes erros da Igreja Católica Apostólica Romana, num momento em que, precisamente, as outras igrejas, mostram uma boa filosofia de inclusão, nomeadamente, a Igreja Anglicana e recentemente na Igreja Sueca, que, inclusivamente põe a hipótese de abençoar as uniões entre as pessoas do mesmo sexo"
Primeiro define-se a direcção: "mais um erro histórico da Igreja, numa longa história...", ou seja, é tradição e definição evolutiva da Igreja errar "historicamente", e por isso inevitável que ela fizesse mais este (não se está aqui a argumentar o erro, mas sim a sua inevitabilidade histórica e portanto a sua demonstração automática). Depois mostra-se o exemplo de quem foi "bom aluno" do progresso e o aceitou no seu leito, com uma "boa filosofia de inclusão".
Compreendo a polémica e acho que é uma boa oportunidade para discussão. Mas fora com este tipo de argumentos, pois são falsos. Apenas admitem um lado "certo" que é o lado cego do progresso. Faz-nos lembrar o comentário do Sócrates sobre Mário Soares: "Esteve sempre do lado CERTO da História" (sério? quem disse? e qual é o "errado" já agora?)
Estou totalmente de acordo com o Bernardo da Motta, do Afixe:
o aborto livre é "progresso", o sacerdócio para os gays e lésbicas é "progresso", a manipulação genética de embriões humanos é "progresso", o abandono de uma religião é "progresso". Admirável mundo novo, este que se aproxima, hã?
Deixemo-nos de tretas, e passemo-nos a tratar uns aos outros com mais respeito! Perguntemo-nos de facto sobre as matérias em questão com os valores em causa, questionemos o futuro que queremos seguir e os valores que queremos semear e cultivar.
Se for preciso parar, porque não? Se for preciso recuar, porque não? Porquê manter os erros se os reconhecermos? E quando pensarmos em todos estes valores e vivermos intensamente o presente na resolução dos problemas de um modo optimista e esperançoso, quando compreendermos que temos de nos ouvir uns aos outros e não a uma voz distante que grita progresso em tudo o que é lado...
Talvez assim... haja progresso!