segunda-feira, maio 30, 2005

 

Arte Contemporânea

Hoje, uma questão assaltou-me: o que é ser “contemporâneo”? Todos somos contemporâneos na nossa contemporaneidade ou no nosso “tempo”, e se assim é, porquê o termo “Arte Contemporânea”, não foi ela sempre assim?

Tal questão começou a irromper na minha mente já há dez anos, quando eu, mais ingénuo, perguntei ao meu professor de história de então qual o estilo que hoje vivíamos. Respondeu-me que hoje não havia estilos, poderia-se fazer tudo o que se podia imaginar (não há fronteiras) e fiquei insatisfeito com a resposta, não a compreendi. Reflecti então que este é o primeiro Tempo da nossa História em que não há estilos, e isso tem a ver com a “contemporaneidade” em que vivemos.

Toda esta questão me lembra Heidegger, na sua acepção de Ser e Tempo. No seu pequeno livro “o conceito do tempo” ele define o ser-aí (Daseín) como o próprio Tempo, ou seja o tempo é o que nós somos quando em confronto porque em trânsito para com a nossa própria morte. O tempo, além disso, é individual, o meu tempo entra em confronto com o tempo dos outros, que é diferente, é relativisticamente Einsteiniano. Apenas na partilha desse porvir último do tempo que é a Religião se consegue obter um tempo “nosso”.

Assim podemos nós compreender melhor o que significa “Arte Contemporânea”, ou seja, a Arte daqueles que com o seu próprio tempo se confrontam com o tempo dos outros, dentro de uma comunidade que partilha a Arte como uma musa. A Arte Contemporânea distingue-se assim por ser dialogante e não discursiva, de confrontação e não de partilha, de competição e não de união. A Arte tornou-se meio de comunicação, o que difere de invocação, informação ou inspiração, a Arte é um media através da qual os artistas se “falam”.

Pondo a ênfase na comunicação teremos o problema da semântica. Ao mesmo tempo que a arte se torna livre e dialogante, a sua língua desconstrói-se pela mesmíssima razão, subjectiviza-se e relativiza-se. Cada vez mais é necessário um enorme conhecimento da Arte através não só das disciplinas artísticas como também das psicológicas para se perceber o que cada objecto de arte poderá querer dizer, ou estar a dizer (separo aqui o objecto de arte do artista, que a partir do momento que a concebe, passa a ser leitor da mesma, com um ponto de vista relativo ao nosso). Acontece que temos coisas diferentes a dizer e de modos diferentes, ontologicamente diferente: não mais partilhamos o nosso porvir, e por conseguinte não mais consigo comunicar. Então berramos.

De modo a dialogar, o artista prende-se com um dilema: ou avança sozinho numa busca do seu porvir no campo da arte, perdendo-se num caminho elitista e fantasista, irrealista pois perdido no seu próprio tempo, não mais partilhado com o nosso; ou então diminui a qualidade, complexidade e articulação do seu discurso de modo a conseguir ter ainda “algo em comum” com os outros, cada vez mais distantes entre si. Tal distinção faz-se hoje entre a “erudição” e a “pop”. A Arte perde o seu significado, decaíndo em Naturalismos rendidos à exposição dos medos e desejos, através de formalismos fantásticos dos Efeitos Especiais, ilusionistas por excelência.

Porquê? Porque na sua busca da contemporaneidade, a Arte perdeu a sua própria História. E é na historicidade que o ser-aí / ser-tempo de Heidegger tem a sua concepção. A Arte poderá apenas ser contemporânea de facto se ela não se negar mais à sua tradição de significado, de símbolo e de linguagem, se ela não se negar mais à sua própria temporalidade dentro do tempo, do passado para o futuro, acreditando no seu próprio trânsito. Só assim ela deixa de se estagnar no tempo eternamente presente, só assim ela entra em movimento, e o tempo recomeçará.

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